Efeito da variante Delta no Brasil é diferente de outros lugares

 



A disseminação da variante Delta do coronavírus nas duas maiores cidades brasileiras, São Paulo e Rio de Janeiro, não está se traduzindo em aumento substancial de casos de covid-19 e nem de internações.

Na capital paulista, onde a média de casos cai desde junho, cerca de 70% dos novos diagnósticos da doença já são de pessoas infectadas pela Delta, informou a prefeitura na quinta-feira (2).

"Apesar da presença da variante na cidade, o número de casos não apresentou curva de crescimento significativa e, por isso, não oferece risco de impacto sobre a rede de saúde pública da capital", disse a Prefeitura de São Paulo em nota. 

No Rio de Janeiro, de todos os casos de covid-19 confirmados, cerca de 90% são provocados pela Delta. 

A cidade chegou a enfrentar uma alta de novos casos em agosto, mas que diminuiu na última semana do mês. 

Os números nacionais também são de queda. Entre 1º e 31 de agosto, a média diária de novos casos recuou 35%, fechando o mês em 23.143.

Já a média de óbitos teve redução de 32% no período, com 667 registros em 31 de agosto. Isto ocorre em meio a flexibilizações das medidas restritivas de Norte a Sul do Brasil. 

Países como Inglaterra e Israel viram a incidência de novos casos subir significativamente após a disseminação da variante Delta, mesmo com mais da metade da população vacinada, embora a imunização seja crucial para evitar casos graves e óbitos. 

O comportamento da variante Delta tem sido, de fato, diferente do que foi observado em outros locais, afirma o virologista José Eduardo Levi, chefe da unidade de biologia molecular da rede de saúde integrada Dasa e pesquisador do IMT-USP (Instituto de Medicina Tropical da Universidade de São Paulo).

"A gente tem uma situação totalmente peculiar aqui no Brasil em relação ao aumento do número de casos. Se for olhar Israel, Estados Unidos e Reino Unido claramente estão vivendo uma terceira onda por Delta, caracterizada por um aumento grande do número de casos." 

Então, o que está acontecendo no Brasil?

Ainda não há nenhuma constatação científica que explique o impacto diferente da variante Delta aqui, mas Levi tem duas suspeitas.

"Nós tivemos uma incidência muito alta de Gama [variante descoberta em Manaus] em março/abril. Não tem nada provado. [...] Eventualmente, a resposta natural para Gama te dá uma proteção cruzada para Delta maior do que outras respostas naturais, por exemplo, para Alfa, lá no Reino Unido."

A outra possibilidade, acrescenta o virologista, envolve uma vacina não utilizada nos países citados: a CoronaVac.

"A CoronaVac, que foi a vacina mais utilizada aqui, diferente do que alguns dados empíricos sugeriram, eventualmente, tem uma proteção maior para Delta do que as vacinas de RNA mensageiro que foram usadas em Israel e nos Estados Unidos."

O caso brasileiro não é o único. Na América do Sul, Chile, Colômbia e Peru, países que viveram picos de infecções neste ano, também não enfrentam alta de casos impulsionada pela variante Delta.

O virologista diz acreditar que haja um componente associado a variantes locais destes países.

"O Chile chama atenção porque é um país que usou basicamente CoronaVac também. E tem duas variantes que predominam lá. Apesar de terem sido detectados casos de Delta, lá ela não predominou. Eles têm a variante andina, que é a Lambda, e a variante colombiana, que é a Mu, já classificada como de interesse [pela Organização Mundial da Saúde]."

Feriado será o grande teste

Para Levi, o grande teste para saber se o Brasil terá ou não uma terceira onda de infecções impulsionada pela variante Delta deve ser este feriado da Independência.

Com milhões de pessoas viajando, manifestações marcadas e um possível descumprimento por parte de alguns das medidas de proteção, como uso de máscara e distanciamento social, pode haver um aumento das infecções.

"Tem que esperar 15 dias. Se dia 22, 23 de setembro a gente não ver um aumento, escapamos", afirma.

Mesmo que haja um novo pico de casos de covid-19 no Brasil, a pesquisadora do Observatório Covid-19 da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) Margareth Portela, avalia que não deve chegar nem perto do que o país viveu no primeiro semestre, com UTIs lotadas e recordes de mortes.

"A Delta é preocupante, mas eu realmente não consigo hoje enxergar um cenário de março novamente. Para a gente ter um revés como tivemos a partir de dezembro [de 2020], teria que haver uma variante que não respondesse às vacinas que a gente tem hoje. É possível? É possível. É provável? Acho muito pouco provável."

Ela salienta, todavia, que é imprescindível que as pessoas "não se sintam completamente protegidas e negligenciem os outros cuidados".


Fonte:R7