Ano começa sob a sombra dos crimes que marcaram 2020

 


As investigações de um desaparecimento ocorrido em uma noite de Natal, o espancamento até a morte de um cliente negro em um supermercado, a queda de um garoto de 5 anos de um prédio, quando deveria estar sendo cuidado pela patroa da sua mãe. Estes são alguns dos crimes que tiveram intensa repercussão ao longo de 2020.

A cobertura jornalística dessas histórias expôs ações que chocaram boa parte da opinião pública. O R7 relembra alguns desses crimes:

Caso Lucilene

A história da empresária Lucilene Maria Ferrari, de 48 anos, moradora de Porto Ferreira, no interior de São Paulo, ainda é misteriosa. Os familiares e amigos estão tomados pelo sentimento de angústia por não conhecer o destino da mulher que desapareceu na véspera do Natal de 2019.

Lucilene teria sumido após uma discussão com o namorado, Vanderlei Meneses dos Santos, ocorrida no hotel de sua propriedade. O homem, que se tornou suspeito, negou várias vezes envolvimento no desaparecimento da empresária. Em março, ele foi detido, mas acabou solto depois de 60 dias.

As investigações do caso Lucilene completam um ano neste mês de dezembro. O sumiço da dona de hotel também pode estar relacionado ao desaparecimento da jovem Júlia, de 16 anos, ocorrido no dia 23 de dezembro do ano passado, um dia antes de a empresária ter sido vista pela última vez.

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O caso Lucilene sofreu algumas reviravoltas com o passar do tempo. Meses depois do desaparecimento da empresária, um corpo em avançado estado de decomposição, possivelmente de uma mulher, foi localizado em um matagal na zona rural da cidade.

No entanto, o laudo da perícia técnica realizado na ossada revelou que a vítima não era Lucilene, mas sim outra mulher, chamada Morgana. Um homem que teria dado abrigo à Vanderlei após a soltura do suspeito seria o elo entre o desaparecimento das mulheres na cidade.

Caso Isis Helena

A pequena Ísis Helena, de 1 ano e 10 meses, teve o corpo descartado dentro de uma mochila, às margens de um rio, na zona rural de Itapira, no interior paulista, onde morava com a mãe, acusada de ser responsável pela morte da bebê.

Jennifer Natalia Pedro, de 21 anos, está presa desde abril deste ano, depois de ter avisado a polícia onde estava enterrado o corpo da menina nos cerca de dois meses em que Ísis ainda era tida como desaparecida.

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A jovem havia dito anteriormente que a criança, que fazia uso de remédios controlados, teria sofrido uma convulsão e se asfixiado com o próprio leite. À Polícia Civil, a mãe alegou que a filha teve febre por volta da meia-noite, e que ministrou o medicamento ibuprofeno.

Em seguida, Jennifer teria dado mamadeira com leite para a bebê e ido dormir, por volta das 4h. Às 6h15, ela teria acordado e encontrado a menina já "fria". Ísis Helena "tinha espuma e leite nos cantos da boca". Ainda de acordo com a versão, a menina teria sofrido convulsões e morrido por asfixia.

Então, Jennifer teria se desesperado e decidido levar o corpo da menina para o rio. Em seguida, a mulher disse ter consumido drogas no mesmo local, onde diz ter abandonado a filha.

As buscas pelo corpo da criança ao longo do rio do Peixe motivaram uma força-tarefa com a participação da PM, dos Bombeiros e da Defesa Civil. Cães farejadores sentiram o cheiro da criança e da mãe no local.

Após confessar o crime, a mãe chegou a dizer que o fez por ter sido coagida na delegacia. Depois, voltou atrás. O pai da menina, Rafael Schotem, disse sentir desprezo por Jennifer. "Que a justiça seja feita e ela fique presa", declarou à Record TV.

Caso Marina Kohler Harkot

A cicloativista e pesquisadora da USP (Universidade de São Paulo) Marina Kohler Harkot, de 28 anos, morreu atropelada na noite de 8 de novembro enquanto trafegava de bicicleta pela Avenida Paulo VI, no Sumaré, zona oeste de São Paulo. O motorista fugiu sem prestar socorro. O acidente e a atitude do suspeito geraram revolta em familiares, amigos da vítima e cicloativistas.

José Maria da Costa Júnior, de 34 anos, o homem que dirigia o utilitário modelo Hyundai Tucson envolvido no acidente, se apresentou à Polícia Civil após ter se encerrado o período que caracterizava a prisão em flagrante.

Havia uma suspeita que ele tivesse ingerido bebida alcoólica e assumido o volante, versão que negou. Pouco antes do acidente, o motorista do carro estava em companhia de Guilherme Dias Mota e Isabela Maria Serafim, com quem se encontrou em um bar da Vila Madalena, também na zona oeste.

No dia 11, Costa Júnior foi ouvido no 14º Distrito Policial (Pinheiros), mas se manteve em silêncio durante o depoimento e foi liberado. Na saída da delegacia, houve muita confusão. Ele saiu do local sem falar com a imprensa e entrou no carro do advogado sob protestos — gritos de "assassino" e do nome de Marina, ditos por ciclistas que estavam na porta da delegacia.

A autoridade policial responsável solicitou a prisão preventiva do autor do crime. Porém, em razão do artigo 236 do código eleitoral, (Lei 4737/65), ninguém pode ser preso desde cinco dias antes e até 48h depois do encerramento da eleição, somente em casos de flagrante.

No dia 16 de dezembro, o Ministério Público de São Paulo denunciou Costa Júnior à Justiça pelo crime. No documento, assinado pelo promotor Rogério Leão Zagallo, é destacado o fato de o condutor ter fugido do local e estar "com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool."

Caso João Alberto

João Alberto Silveira Freitas, um cliente negro, de 40 anos, foi espancado e morto por dois seguranças brancos em uma unidade do supermercado Carrefour em Porto Alegre, no fim da noite de 19 de novembro, véspera do Dia da Consciência Negra no Brasil. Um dos agressores era um policial militar temporário.

O caso gerou uma série de manifestações antirracistas na capital gaúcha e em outras cidades do país. A força dos protestos motivou um posicionamento oficial da direção do Carrefour sobre a morte de João Alberto e o anúncio de medidas para combater o racismo estrutural no quadro de funcionários e colaboradores da empresa.

A Polícia Civil gaúcha indiciou seis pessoas por responsabilidade no crime. Além dos dois vigilantes e da fiscal da loja, que estavam presos desde o dia do assassinato, outros três funcionários foram indiciados por homicídio triplamente qualificado — por motivo torpe, emprego de recurso que dificultou a defesa da vítima e asfixia por meio de sufocação indireta. Os acusados podem enfrentar um júri popular.

No dia 17 de dezembro, o Ministério Público gaúcho ofereceu denúncia contra os seis acusados pelo assassinato.

Caso Miguel

O menino Miguel Otávio Santana da Silva, de 5 anos, morreu no dia 2 de junho, após cair de um prédio de luxo em Recife (PE). Sem aulas por causa da pandemia do novo coronavírus, ele teve de acompanhar a mãe ao trabalho, em um apartamento no quinto andar do edifício.

Miguel era filho de uma empregada doméstica que trabalhava na casa do prefeito de Tamandaré, cidade no litoral sul do estado pernambucano. Mirtes Renata Santana teve que sair para passear com o cachorro da família e deixou o filho com a patroa. "Eu confiei meu filho uma vez a ela e foi fatal", desabafou.

Imagens de câmeras de segurança do prédio mostram Miguel já dentro do elevador, junto com a patroa da doméstica. A gravação revelou que a mulher apertou o botão do nono andar e deixou que a porta do elevador se fechasse com o garoto, sozinho.

No início, a Polícia Civil chegou a imputar à acusada o crime de homicídio culposo, quando não há intenção de matar, pelo qual foi presa em flagrante. No entanto, ela pagou uma fiança no valor de R$ 20 mil e foi posta em liberdade.

A ex-patroa de Mirtes Renata, Sarí Corte Real, deixou a primeira audiência de instrução e julgamento do caso em silêncio. Ela foi indiciada por abandono de incapaz, crime que prevê pena de 4 a 12 anos de reclusão.