Lockdown: “A população entendeu a gravidade do que estávamos enfrentando”, diz Edinho

 




Para prefeito, empregos irão retornar se houver um ambiente de estabilidade no país; “com a pandemia sem controle, a crise econômica irá persistir”
Por José Augusto Chrispim
As medidas restritivas de isolamento social adotadas pela Prefeitura de Araraquara em fevereiro, incluindo o ‘lockdown’, deram resultado e fizeram cair o número de novos casos confirmados de Covid-19 e a média móvel diária no mês de março. A cidade vinha registrando um aumento expressivo de casos positivos de pessoas infectadas com o novo coronavírus desde o final de janeiro. A grave situação se estendeu até o começo de fevereiro, quando foram registrados 45% a 50% de amostras positivas no município. As medidas drásticas adotadas pela prefeitura começaram a mostrar resultados no início de março com a redução para 30%, 20% dos casos.
Segundo os especialistas em saúde pública, com a vacinação ainda em ritmo lento, o isolamento social ainda é a melhor forma de conter o crescimento de contaminações e evitar a sobrecarga do sistema de saúde.
O jornal O Imparcial conversou com o prefeito Edinho Silva (PT) sobre a atual situação da área da saúde no município e como as medidas restritivas influenciaram para a queda nos números de vítimas da Covid-19. O prefeito também foi questionado sobre quais medidas estão sendo tomadas no sentido de mitigar os efeitos negativos da pandemia na economia local.
Veja a entrevista na íntegra:
O Imparcial: Quais medidas podem ser desenvolvidas pelo Município para minimizar os prejuízos dos comerciantes causados pelas restrições do Plano São Paulo?
Edinho: “Tudo o que é possível ser feito no âmbito da municipalidade, nós estamos fazendo. Mandamos essa semana um projeto de lei para a Câmara, inclusive em diálogo com o presidente da Casa Aluísio Braz, o Boi, e com o vereador Lucas Grecco, que vai beneficiar muito quem está sofrendo com crise econômica, aprofundada pela pandemia. Haverá maior facilidade na quitação dos débitos e isso significa que pessoas físicas e jurídicas poderão acertar suas pendências em impostos municipais e evitar que os débitos sejam questionados judicialmente. O contribuinte pessoa física que optar pelo ingresso no REFIS 2021 terá direito ao desconto de 50% dos juros e da multa de mora incidentes sobre o valor principal da dívida, para pagamento em até 48 parcelas mensais, com entrada à vista de 5% do valor total a ser parcelado; ou desconto de 75% dos juros e da multa de mora incidentes sobre o valor principal da dívida, para pagamento em até 24 parcelas mensais, com entrada à vista de 5% do valor total a ser parcelado.
Empresas, inclusive autônomos, que comprovarem queda de faturamento de pelo menos 30% em relação a 2019 podem parcelar os débitos em tributos municipais em até 96 meses. Vamos suspender, até 30 de junho, os ajuizamentos de novas ações (a chamada execução fiscal), com exceção, claro, das ações referentes a poder de polícia e dos devedores têm débitos inscritos em três exercícios seguidos. Também vamos prorrogar o prazo para pagamento do ISSQN fixo e taxa de poder de polícia (os alvarás) que venceriam em 15 de abril. Agora o pagamento poderá ser feito até 31 de junho de 2021. Estamos ampliando programas sociais como Bolsa Cidadania, Rede de Solidariedade, Jovem Cidadão, Frentes da Cidadania, Apoiadores no Combate à Dengue e à Covid, programas de segurança alimentar e instituindo outros, como o projeto Filhos do Sol, para adolescentes e jovens em situação de risco, com vistas a garantir o socorro às famílias que mais precisam, que lidam com desemprego e a fome. Também estamos buscando alternativas de geração de trabalho e renda, como é o caso do projeto Coopera Araraquara, que visa a ampliação do cooperativismo em Araraquara e às ações de economia solidária e criativa, além da grande ampliação de aquisição de alimentos direto do produtor, incentivando os nossos pequenos agricultores. Entretanto, é necessário que o governo federal, de fato, crie alternativas de apoio à retomada da economia nacional. É preciso que linhas de crédito sejam criadas apoiando as empresas, principalmente das pequenas e médias. Isso já deveria ter sido feito. A descontinuidade do pagamento do Auxílio Emergencial aos trabalhadores informais, microempreendedores individuais (MEI), autônomos e desempregados foi um erro seríssimo que precisa ser rapidamente corrigido, além da ampliação do orçamento federal destinado ao programa Bolsa Família. Aproveito para reforçar aqui algo que sempre digo: criaram uma contradição que não existe entre economia X defesa da vida. O que temos que entender é que a economia dificilmente vai se recuperar enquanto estivermos nessa situação de grande instabilidade no Brasil em virtude do vírus. Caixões estão sendo empilhados em estados e municípios. Famílias inteiras morrendo. São mais de 300 mil mortes. São UTIs lotadas, falta de medicamentos, falta de leitos, falta de profissionais. Qual empresa, desde a pequena, média ou a de grande porte, se sentiria segura em investir neste momento, num país totalmente instável do ponto de vista da saúde? É basicamente inviável. Volto a dizer, a economia só retomará sua normalidade quando equacionarmos a pandemia.
O Imparcial: Quais medidas foram mais decisivas para a diminuição nos novos casos e consequente diminuição da ocupação dos leitos de hospital por pacientes com Covid-19 em Araraquara?
Edinho: “A medida mais decisiva foi o distanciamento social, o chamado lockdown. E aproveito este espaço do jornal O Imparcial para agradecer à população de Araraquara, que entendeu a gravidade do que estávamos enfrentando e ficou em casa. Nunca imaginamos ver Araraquara tão vazia como ficou durante aqueles dias. Mas foi uma medida necessária e que salvou vidas. Quando as pessoas reduzem a circulação, também reduz a circulação do vírus. Muita gente pode estar assintomática e transmitir o vírus sem saber. Isso é a ciência quem diz. Trinta dias depois do início do lockdown, nós reduzimos os casos por semana em 57%, os óbitos por semana em 39% e a média móvel de casos em 58%. As amostras positivadas caíram 70%. Na última sexta-feira, dia 26, as amostras positivas representavam 7% do total das coletas enviadas aos laboratórios públicos, isso é um dado definitivo para nos dizer que a doença vai diminuir muito nos próximos dias. As internações caíram menos, 21%, mas porque Araraquara atende outros municípios da região e o nosso DRS 3 (Departamento Regional de Saúde) está em situação crítica. Hoje Araraquara está com 92 pacientes da região internados em Araraquara por conta da pandemia. Estamos há 20 dias sem nenhum paciente aguardando leitos na nossa rede. Isso significa que afastamos, definitivamente, o risco de colapso do sistema de saúde. O lockdown feito por Araraquara foi fundamental para salvarmos vidas. Enquanto não houver vacinação em massa no Brasil, com a maioria da população imunizada, a única saída para controlar a doença é o isolamento social”.
O Imparcial: Araraquara foi modelo para o Brasil da eficiência do lockdown que, agora, está sendo utilizado em outros municípios. Existe a possibilidade de se utilizar essa medida drástica outra vez?
Edinho: “Nossos profissionais da Secretaria de Saúde, da Vigilância Epidemiológica, junto com outras autoridades de saúde do município, cientistas e pesquisadores, acompanham diariamente a situação da pandemia. Nós temos em circulação uma nova mutação do coronavírus, que é mais transmissível e está agravando pacientes jovens e saudáveis. Portanto, a situação de todo o Brasil, e da nossa região, por consequência, ainda é muito preocupante. É a maior tragédia humanitária da história do Brasil. Se a situação da pandemia se agravar novamente em Araraquara e os especialistas entenderem que será necessário um novo lockdown, nós tomaremos essa medida para salvarmos vidas. Para que um novo lockdown não seja necessário, é fundamental que a população só saia de casa se for necessário e, quando sair, tome todos os cuidados. Não é hora de festas com os amigos, de encontros com os familiares. Precisamos de mais um pouco de sacrifício enquanto a vacinação ainda avança de forma lenta. Preocupa-nos muito o feriadão da Páscoa e o risco das visitas, encontros e festas familiares ou clandestinas. Isso tem nos apavorado. A capital está em lockdown, a Baixada Santista também, o Litoral Norte fechando. Assim, o interior “vai ferver”. Não podemos perder tudo que conquistamos até agora”.
O Imparcial: Com a distribuição de pacientes com Covid-19 em hospitais da região pelo sistema CROSS, existe a necessidade de um esforço coletivo dos prefeitos para combater a pandemia na região. O que está sendo feito nesse sentido?
Edinho: “Os municípios da região têm se reunido frequentemente, por videoconferência, junto com a diretoria do Departamento Regional de Saúde e representantes da Secretaria de Desenvolvimento Regional do Governo do Estado. Todos os prefeitos sabem da situação crítica da ocupação de leitos na região. Eu acredito que as ações de enfrentamento da pandemia devem ser regionais, e existe um esforço do DRS nesse sentido de tomar medidas uniformes nas 24 cidades que integram o DRS. Mas, para isso, é necessária a adesão de todas as Prefeituras. Eu sempre digo que Araraquara, sozinha, não sairá da fase vermelha do Plano São Paulo. É a união de todas as cidades que fará com que sejam reduzidas as internações, salvando vidas e tirando nossa região da fase mais restritiva, possibilitando o retorno gradual dos setores econômicos”.
O Imparcial: No ápice da pandemia em Araraquara, entre fevereiro e início de março, faltaram leitos na cidade. O que está sendo feito para que essa situação não se repita?
Edinho: “Nós estamos em constante diálogo com o Governo do Estado, que inclusive nos ajudou com a abertura de novos leitos. Foram 20 novos leitos de UTI no Hospital da Solidariedade, o hospital de campanha, que chegou a 71 leitos. O HEAB abriu mais 20 leitos de UTI, a Santa Casa mais oito. O Pronto-Socorro do Melhado tem 48 leitos, são 20 que estavam na Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias e outros 28 leitos abertos depois. Agora abriremos mais 21 na Igreja Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, que retomou a parceria. Ou seja, a Prefeitura está trabalhando para ampliar a assistência médica. Mas a evolução da pandemia depende muito do isolamento social e da vacinação. Enquanto não se imuniza grande parte da população, é fundamental sair de casa somente se necessário. Araraquara unida na defesa da vida”.
O Imparcial: A medicação usada para a intubação de pacientes está em falta em algumas cidades do país. Existe o risco de ocorrer essa falta em Araraquara?
Edinho: “Não existe esse risco no momento. Os hospitais de Araraquara têm medicamentos e irão dar toda assistência ao paciente contaminado com a Covid-19 e que está lutando pela vida. Mas o estoque é para o momento, é necessário que o Ministério da Saúde tome medidas urgentes para a superação desse desabastecimento”.
O Imparcial: Como o Poder Público pode auxiliar as pessoas que perderam seus empregos devido à pandemia do coronavírus?
Edinho: “Mandamos para a Câmara, como já disse anteriormente, o maior e mais amplo programa de socorro aos empresários, autônomos, empreendedores, e também para a pessoa física da história da cidade, dentro do que cabe ao Município. Do ponto de vista social, estamos propondo, por exemplo, o projeto Filhos do Sol (Programa Municipal de Transferência de Renda, Oferta de Ações Socioeducativas, Qualificação Profissional e Vivência no Mundo do Trabalho a Adolescentes e Jovens em Situação de Extremo Risco Pessoal e Social). O público-alvo é adolescentes e jovens entre 12 e 21 anos e que foram marcados por vivências de riscos, como trabalho infantil, egressos de medidas socioeducativas, egressos ou em cumprimento de medida de proteção (acolhimento) devido a afastamento judicial da família, pessoas em situação de rua (até 18 anos incompletos), vítimas de violência ou jovens que concluíram o ensino médio e estão em risco, sem acesso à continuidade dos estudos. A concepção do Filhos do Sol ocorre de articulação da Prefeitura com a Vara da Infância e Juventude e do Idoso da Comarca de Araraquara. Em relação à transferência de renda, os valores serão entre R$ 200 e R$ 600 mensais. Também estamos ampliando o atendimento do programa Bolsa Cidadania, programa que criamos em 2019. Passam a ser priorizadas as famílias elegíveis para o Bolsa Família e não contempladas com o benefício. Caso haja a aprovação da lei, o prazo de concessão do Bolsa Cidadania também será ampliado de 6 meses para 1 ano, podendo ser prorrogado por mais 6 meses após com análise técnica e aprovação do Comitê Municipal Bolsa Cidadania. Logo no início da pandemia, nós também criamos a Rede de Solidariedade, um programa para atendimento alimentar às famílias mais necessitadas e com vulnerabilidade agravada pela crise econômica causada pela pandemia. Temos uma meta aqui em Araraquara: que não falte alimento na mesa de nenhuma família. A Prefeitura também compra alimentos da agricultura familiar e distribui cestas de hortifrútis semanalmente. Isso é o que o Município tem condições de fazer. Mas é preciso um socorro maior por parte do Governo Federal. É lamentável que o auxílio emergencial tenha sido suspenso desde dezembro e só irá retornar em abril, aumentando a vulnerabilidade social das famílias. É preciso combater a pandemia. Os empregos irão retornar se houver um ambiente de estabilidade no País. Com a pandemia sem controle, a crise econômica irá agravar”, finalizou o prefeito Edinho Silva.