Rússia usa bomba de fragmentação para atacar hospital na Ucrânia; veja como funciona

 





A Rússia utilizou bombas de fragmentação para atacar um hospital, uma ambulância e veículos de civis na cidade de Vuhledar, na região ucraniana de Donetsk. Na ofensiva, que matou quatro civis e deixou 10 feridos, entre eles, profissionais de saúde, foi utilizado um tipo de armamento proibido por meio de tratato internacional desde 2008 e assinado por mais de 100 países. Não fazem parte dessa lista, porém, EUA, Rússia, Ucrânia e Brasil. 

Os ataques russos entram, nesta terça-feira (1º), no sexto dia. Segundo o ministro da Defesa, Serguei Shoigu, a Rússia seguirão com a ofensiva na Ucrânia até alcançar seus objetivos. "As Forças Armadas continuarão a operação militar especial até que sejam cumpridos os objetivos fixados", afirmou Shoigu.

"Essas munições têm um grande alcance em termos de território e efeitos indiscriminados, por isso a proibição internacional", afirma Maria Laura Canineu, diretora da ONG Human Rights Watch no Brasil. A organização analisou fotografias enviadas por funcionários do hospital em Donetsk e identificou o uso do armamento proibido. "Esses armamentos podem ter efeitos de longo prazo quando não explodem imediatamente."

A médica-chefe do hospital bombardeado, Natalia Sosyura, descreveu o ataque à ONG: “Eu estava no primeiro andar do nosso prédio de dois andares. Ouvi uma forte explosão lá fora, corremos para o corredor. Por sorte, não tínhamos muitos pacientes. Era por volta das 10h30. Todos nós caímos no chão.”

Essas munições têm um grande alcance em termos de território e efeitos indiscriminados, por isso a proibição internacional

MARIA LAURA CANINEU, DIRETORA DA ONG HUMAN RIGHTS WATCH NO BRASIL

"As forças russas devem parar de usar munições cluster e acabar com ataques ilegais com armas que matam e mutilam indiscriminadamente", declarou Steve Goose, diretor de armas da Human Rights Watch.

Uso de bombas de fragmentação

Com base em registros fotográficos enviados por funcionários do hospital, a Human Rights Watch identificou restos de armas com características de uma "ogiva de munição cluster 9N123", utilizada em um míssil balístico Tochka série 9M79.

De acordo com o relatório, a ogiva de munição cluster contém 50 submunições de fragmentação 9N24. Segundo informações do fabricante russo, cada submunição contém 1,45 kg de explosivos e se estilhaça em aproximadamente 316 fragmentos.

Hospital atacado por mísseis russos na cidade de Vuhledar

Hospital atacado por mísseis russos na cidade de Vuhledar

DIVULGAÇÃO ONG HUMAN RIGHTS WATCH

Fotografias tiradas logo após o ataque mostram, segundo a ONG, respingos de impacto de uma suposta detonação de submunição no asfalto próximo de dois dos veículos, além dos danos de fragmentação de tamanho uniforme no prédio do hospital e ferimentos de fragmentação fatais nas vítimas perto de uma detonação de submunição, característica de uso de munição cluster.

Segundo investigações da ONG Human Rights Watch, forças do governo ucraniano e grupos armados apoiados pela Rússia usaram munições de fragmentação no leste da Ucrânia entre julho de 2014 e fevereiro de 2015.

“Todos os estados signatários da Convenção de 2008 sobre Munições Cluster devem condenar inequivocamente este ataque e qualquer outro uso dessa arma terrível”, disse Goose, diretor da ONG. “Os riscos para os civis são intoleravelmente altos.”

O que são as munições clusters

As bombas de fragmentação, também conhecidas como munições cluster, são lançadas de aernaves ou disparadas do solo ou do mar. No trajeto, elas se se abrem ainda no ar para liberar dezenas ou centenas de outras pequenas munições que, segundo a Coalizão Contra Munições Cluster, podem atingir áreas equivalentes a diversos campos de futebol.

Segundo a coalizão global, que trabalha para erradicar as munições clusters, qualquer pessoa que esteja nessa área, militares ou civis, será morta ou gravemente ferida. De acordo com o Tratado Internacional sobre Bombas de Fragmentação, esse tipo de armamento é definido como um tipo de categoria proibida de armas.

Bombas de fragmentação na Síria

Esta, porém, não é a primeira vez que esse armamento é utilizado em um conflito global. De acordo com denúncias feitas pela ONG Human Rights Watch, foram deflagrados ataques com esse tipo de munição por forças do governo sírio em áreas de oposição desde 2012. A Rússia, segundo a ONG, tem participado de operações militares com forças sírias desde setembro de 2015.

Diversas evidencias coletadas por ativistas e equipes médicas que oferecem os primeiros socorros às vítimas apontam que pelo menos 238 ataques foram orquestrados com o uso das munições clusters na Síria entre agosto de 2016 e julho de 2017.

"Nos últimos cinco anos, o uso de munições clusters na Síria é um motivo de forte indignação e contribui para a contaminação de minas terrestres e restos explosivos de guerra naquele território", disse Mary Wareham, diretora de advocacy da Divisão de Armas da Human Rights Watch. "Há esforços heroicos para localizar e destruir essas armas, que representam um obstáculo fundamental para o acesso à assistência em todo o país".

O uso de munições clusters na Síria é um motivo de forte indignação e contribui para a contaminação de minas terrestres e restos explosivos de guerra naquele território

MARY WAREHAM, DIRETORA DE ADVOCACY DA DIVISÃO DE ARMAS DA HUMAN RIGHTS WATCH

O relatório da Human Rights Watch ressalta ainda que muitos armamentos não detonam no impacto inicial, deixando submunições carregadas pelo solo, semelhantes às minas terrestres - que podem explodir a qualquer momento. Até o momento, são 102 países signatários da Convenção sobre as Munições de Fragmentação e 17 que ainda não ratificaram.

A Coalizão Contra Munições Cluster registrou pelo menos 971 novas vítimas de bombas de fragmentação em 2016, incluindo 860 na Síria e 38 no Iêmen. A maioria das mortes na Síria e no Iêmen ocorreu durante os ataques por armas de fragmentação, enquanto outras foram causadas por submunições não detonadas.

De acordo com a Human Rights Watch, em dezembro, o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergey Lavrov, apresentou um documento com o posicionamento do país sobre as munições de fragmentação na Síria. Nele, Lavrov não negou ou admitiu explicitamente o envolvimento da Rússia nos ataques com essas armas. Mas o documento faz uma alegação geral de que as munições cluster foram usadas de acordo com o direito internacional humanitário e não indiscriminadamente.

"Justificativas de países como Arábia Saudita, Síria e Rússia, de que as munições cluster podem ser usadas de forma discriminada sob as leis da guerra são simplesmente equivocadas", disse Wareham. "Evidências mostram que o tratado de proibição de munições clusters vem causando um impacto positivo, mas os países que não assinaram precisam fazê-lo o quanto antes e parar de fechar os olhos para o terrível sofrimento que essas armas causam".

Fonte:R7