Na primeira semana de funcionamento da plataforma do programa Desenrola Brasil, lançada na segunda-feira passada (9), não faltaram manifestações de usuários nas redes sociais, alguns celebrando a oportunidade de pagar suas dívidas com desconto, outros ainda em busca de respostas para suas dúvidas. Mas uma parcela das pessoas se dedicou a falar inverdades sobre a política de renegociação de dívidas.
O comentário que teve o maior alcance, principalmente na rede X (antigo Twitter) e no TikTok, foi o de que as pessoas que pagarem suas dívidas pelo programa do governo "nunca mais" terão acesso a crédito e a financiamentos. Também andaram dizendo que haverá uma restrição no nome do devedor em uma "lista" do BC (Banco Central).
Quanto à primeira afirmação, é preciso esclarecer que não existe nenhuma relação entre o pagamento de dívidas, seja pelo Desenrola, seja por qualquer outro meio, e os critérios usados por bancos e demais instituições financeiras para conceder empréstimos e aprovar financiamentos. Quitar débitos sempre é positivo para o consumidor, que só assim volta a ter o nome limpo nos serviços de proteção ao crédito.
Cada companhia (banco, financeira, comércio etc.) define as próprias regras para avaliar os riscos das operações de crédito. Um dos critérios utilizados é o score do cliente, um indicador das chances de cada pessoa pagar as contas em dia, calculado por empresas como a Serasa.
Há instituições que, antes de conceder novos empréstimos ou financiamentos, analisam sua relação com o cliente ao longo do tempo ou consideram o histórico dele com outros credores. Se os riscos de atraso ou de falta de pagamento forem grandes, é muito provável que o banco ou outro credor não se interesse em fechar o contrato.
Sobre a "lista" e a restrição no Banco Central mencionadas nas postagens que viralizaram, supõe-se que se trate do Registrato. Em seu site, a própria autarquia o define como "um sistema em que você consulta, de graça, empréstimos em seu nome, bancos onde tem conta, chaves Pix cadastradas, dívidas com órgãos públicos federais, cheques sem fundos e dados de compra ou venda de moeda estrangeira".
Nesse sistema, os bancos registram as informações financeiras de seus clientes, incluindo a falta de pagamento de dívidas e parcelas em atraso, como determina o BC. "É um histórico que indica a probabilidade de cada pessoa honrar seus compromissos", explicou a influenciadora Nath Finanças em uma thread no X em que esclarece dúvidas sobre o Desenrola.
"Se todos os compromissos são pagos em dia, [a pessoa] não terá nenhum apontamento [no Registrato]. Se tem algum atraso ou inadimplência, ficará esse histórico. Dessa forma, além da possível negativação na Serasa, por exemplo, o perfil fica com uma marca no Registrato, por não honrar o compromisso. O score fica um pouco prejudicado, e isso vai sendo acumulado a cada nova operação", completou Nath.
Esse procedimento, assim como a consulta a outros bancos de dados, faz parte da rotina de análise de riscos das instituições financeiras e demais empresas que oferecem crédito e não tem relação com a criação do Desenrola Brasil.
O programa incentiva credores a oferecer descontos a pessoas físicas para que elas paguem, à vista ou a prazo, dívidas negativadas entre 1º de janeiro de 2019 e 31 de dezembro de 2022. Com a quitação, o devedor é "desnegativado", e, oficialmente, seu nome deixa de ter restrição de crédito.
Dívidas de outros períodos, por não cumprirem os requisitos do Desenrola, devem ser negociadas diretamente com as instituições. Se o cliente tiver contas em atraso a serem pagas pelo Desenrola e outras fora do programa, e caso estas já tenham sido negativadas, o cadastro dele só voltará a ficar positivo quando tudo for acertado.
Para saber se você tem alguma pendência referente aos meses cobertos pelo programa, basta consultar a plataforma, pelo link https://desenrola.gov.br/. Caso existam dívidas, também será possível acessar as propostas de descontos oferecidas pelas empresas que aderiram ao sistema, que podem ser superiores a 90%.
Após o pagamento à vista ou o da primeira parcela da dívida renegociada, as instituições têm um prazo de até 15 dias úteis para dar baixa no débito do cliente. Portanto, pode demorar um pouquinho para o nome "ficar limpo" e o consumidor recuperar o acesso ao crédito.
Além disso, é importante considerar a análise de risco, feita sistematicamente pelas empresas, como explicado anteriormente.
No site do Desenrola, o pagamento a prazo é oferecido prioritariamente às pessoas que recebem até dois salários mínimos (R$ 2.640 mensais) ou estão inscritas no CadÚnico (Cadastro Único para Programas Sociais, do governo federal) e têm dívidas de até R$ 5.000.
Para oferecerem descontos às pessoas nessas situações e facilitarem o pagamento de suas dívidas, 924 credores aderiram voluntariamente ao programa. Portanto, não são todas as instituições que fazem parte do Desenrola; algumas empresas não tiveram interesse em participar.
O total de credores participantes representa 86% dos 51 milhões de dívidas de pessoas físicas desse grupo, que alcançaram descontos que somam R$ 59 bilhões. Após a aplicação das reduções, o volume financeiro a ser renegociado em dívidas de até R$ 5.000 é de R$ 13 bilhões.
Os pagamentos a prazo poderão ser feitos em até 60 meses, com taxa de juros de até 1,99% ao mês, o que foi viabilizado pelo governo graças aos R$ 8 bilhões do FGO (Fundo de Garantia de Operações).
Como há uma diferença de R$ 5.000 entre o valor disponível como garantia e o montante a ser pago pelos inadimplentes, não são todas as dívidas que poderão ser quitadas com a melhor condição de parcelamento, já que a cada 20 dias a "fila" das propostas apresentadas pelos credores anda, e novas oportunidades de descontos são apresentadas.
Por isso, é bom ficar atento: se encontrar uma renegociação "irrecusável", não perca tempo para aceitá-la, porque ela pode não ser oferecida novamente.
De acordo com o Ministério da Fazenda, o Desenrola tem, ainda, 9 milhões de dívidas entre R$ 5.001 e R$ 20 mil, para as quais foi oferecido o desconto total de R$ 68 bilhões. Após a aplicação das reduções, o volume financeiro renegociado com esse grupo pode chegar a R$ 12 bilhões.
As dívidas entre R$ 5.001 e R$ 20 mil só poderão ser pagas à vista, e os descontos oferecidos pelos credores já estão cadastrados na plataforma, na qual é concretizada a negociação.
Fonte:R7